Luciana Abade, Jornal do Brasil
BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou quarta-feira, Dia Internacional Contra a Corrupção, que encaminhará ao Congresso Nacional um projeto de lei que torna hediondos crimes de corrupção cometido por autoridades de alto escalão, sejam elas da administração pública federal, estadual ou municipal. Com isso, passarão a ser considerados crimes hediondos, logo, inafiançáveis, práticas como corrupção ativa, passiva, concussão e o peculato. O projeto do presidente se somará a cerca de 60 proposições que tramitam no Congresso – a mais antiga é de 1993 – e que tentam, de alguma forma, tornar mais rígida a punição de corruptos.
A proposta de Lula não traz em si nenhuma novidade. Em 2007, o deputado Humberto Souto (PPS-MG) apresentou na Câmara dos Deputados o PL 1368 que torna o crime de corrupção hediondo. Ou seja, inafiançável, sem direito a indulto ou progressão de regime. Além do livramento condicional só passar a valer após o cumprimento de dois terços da pena.
Souto acredita que Lula anunciou o projeto porque não tinha conhecimento da existência do texto de sua autoria, já aprovado na Comissão de Segurança Pública.
– Qualquer iniciativa de um presidente que procura acabar com essa mancha na administração pública deve ser elogiada – diz o deputado.
Para outros parlamentares, se não inovar, o PL de Lula será só mais um em uma mar de propostas emperradas:
– Se o presidente Lula não especificar no texto qual a rapidez com que devem ser punidos quem comete o crime de corrupção, este projeto dele não vale nem dois mirréis – dispara o senador Pedro Simon (PMDB-RS)
Para o cientista Político Geraldo Tadeu Monteiro, a proposta de Lula é a velha “tentação brasileira de reiventar a roda e usar isso nos programas eleitorais”.
– Tornar a corrupção hedionda não vai impedi-la – defende o cientista. – É preciso medidas de prevenção como a descentralização e a desburocratização.
Ficha Limpa
Entre os projetos que procuram combater à corrupção que permanecerão engavetados pelo menos até o próximo ano está o de iniciativa popular que visa proibir a candidatura de políticos com “ficha suja”. Inconformados com o adiamento da votação, representantes da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil e do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral estiveram quarta-feira na Câmara para entregar ao presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), mais 200 mil assinaturas de cidadãos que apoiam a proposta. Temer afirmou que não conseguiu incluir a proposição na pauta de reunião de líderes na última terça-feira.
A Frente Parlamentar Anticorrupção também esteve com Temer. Os representantes entregaram a ele a lista com os 60 projetos de combate a corrupção que tramitam no Congresso e pediram agilidade nas votações dos mesmos. Segundo o levantamento, 29 já estão prontos para a pauta do plenário.
Apesar de lamentar o adiamento da votação do Ficha Limpa, o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR) acredita que a proposta deve ser votada até fevereiro do ano que vem, o que possibilitaria a aprovação das novas regras para o pleito de 2010. E, mesmo que não seja aprovada a tempo, Fruet acredita que já servirá de referência para que as legendas escolham seus candidatos:
– Não tenho falsas esperanças. Não há lei no mundo que impeça a corrupção, mas se tivermos capacidade de construir um texto que que não afronte a constituição, conseguiremos sua aprovação a tempo das eleições.
A lentidão para aprovar projetos que combatem à corrupção não se limita à Câmara. No Senado, Pedro Simon pediu ao presidente José Sarney (PMDB-AP) que seja votado no plenário, antes do recesso parlamentar, um pacote com 20 propostas já aprovadas na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ) que alteram dispositivos da Lei das Inegilibilidades, a Lei Complementar 64/1990. Os projetos, de acordo com o senador, exigem uma vida pregressa ilibada para o exercícios dos mandatos:
– O que a frente anticorrupção da Câmara fez em forma de ato, nós fizemos de forma objetiva.
Em cerimônia, Lula diz que corrupto tem “cara de anjo”
O presidente Lula disse quarta-feira que o projeto de lei do governo tem como objetivo combater a “safadeza” realizada com o dinheiro público no país. Ao discursar em cerimônia comemorativa pelo Dia Internacional Contra a Corrupção, Lula disse que prefere “manchetes de jornais” que denunciam desvios de dinheiro público ao silêncio sobre os crimes, para que o governo possa “combatê-los”.
– Não é a única saída, mas é mais um degrau na escalada de combate à safadeza com dinheiro público nesse país – argumentou Lula. – Pode ser que (o projeto) não resolva, mas se o Congresso aprovar, pelo menos a gente começa a passar à sociedade que não existe a ideia da impunidade.
Lula também mencionou a questão cultural como um dos fatores que impulsionariam a corrupção no país. Segundo o presidente, 90% dos brasileiros acreditam na impunidade de políticos corruptos porque prevalece no Brasil a leitura de que “o cara que rouba pãozinho vai preso, e o que rouba R$ 1 bilhão não vai preso”.
O presidente sugeriu ainda que a administração pública faça um “check-up” anual para tentar identificar ações de corrupção para que a população não seja enganada.
– Acho que o trabalho que estamos fazendo é quase como fazer check-up. O corrupto é o cara que tem a cara mais de anjo, é o que mais fala contra a corrupção, o que mais denuncia, porque acha que não vai ser pego. Esse é o problema da bandidagem, o cara sempre acha que vai dar no outro, ele vai ser impune, só que às vezes a arapuca pega o seu passarinho – explicou o presidente, que também fez uma comparação entre as drogas e a corrupção que lembrou bastante as alegações utilizadas para negar qualquer conhecimento sobre o suposto pagamento do governo a parlamentares da base aliada, o chamado escândalo do mensalão. – Um pai vê na TV um adolescente pego com droga, ele acha que é só o filho dos outros. Às vezes o filho dele está queimando um baseadinho no quarto, e ele não sabe. A corrupção é assim, às vezes está dentro da sua casa e você não sabe.
Lula ainda elogiou o trabalho da Polícia Federal e o Ministério Público pelas ações de combate à corrupção, mas ressaltou que as instituições devem agir “sem exagero”, uma vez que “todo ser humano é inocente até que se prove o contrário”.
– Nós precisamos motivar as pessoas que sabem a denunciar. Porque a punição tem que ser para o corrupto e para o corruptor. A moeda não tem só um lado, ela tem dois – concluiu o presidente.
O ministro da Controladoria-geral da União, Jorge Hage, também defendeu a transformação da corrupção em crime hediondo.
– O projeto de lei torna hediondo o crime de corrupção quando cometido a partir de um determinado nível de autoridades, que gozam de prerrogativas maiores, dispõem de poder decisório maior – justificou Hage. – É um ato da maior relevância que estamos tomando. Para Hage, uma das dificuldades de iniciativas como essa é que elas precisam reverter uma certa “tradição da impunidade” no Brasil.
– A corrupção envolve um corrupto e um corruptor. Por isso é preciso agir dos dois lados. Nesse sentido, passamos a aplicar a lei também contra as empresas corruptoras. Várias delas já foram declaradas inidôneas e, com isso, proibidas de contratar com a administração pública – acrescentou Hage. – O governo brasileiro não se encontra mais nem na acomodação da tolerância, nem na mera lamentação dos males causados pela corrupção. (Com agências)
22:13 - 09/12/2009
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