sábado, 17 de outubro de 2009

Do IHU Online - Entrevista especial com Marlon Reis

Ficha limpa: “O principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas”

“Não faz sentido o que diz a legislação hoje, pois ela abre as portas da política para criminosos”, reforça o juiz eleitoral.



O projeto Ficha Limpa, que está agora sob a análise da Câmara dos Deputados, visa melhorar o perfil dos candidatos e candidatas a cargos eletivos do país. Se for aprovada, vira lei e, com isso, barra as possíveis candidaturas de políticos que tenham, em sua ficha, delitos graves ou renunciaram para escapar de punições.

Hoje, segundo o juiz Marlon Reis, “o principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas”, muitas delas, inclusive, ligadas a investimentos que deveriam ser feitos nas áreas da saúde e educação.

Em entrevista à IHU On-Line, realizada por telefone, Reis, que faz parte do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, disse que acredita que o projeto vai ser sim aprovado, mas receia que, durante as análises dos deputados e senadores, sejam fixados critérios ou padrões que não representem um ganho efetivo para garantir a qualidade e honestidade do processo eleitoral.

Marlon Reis é natural do Maranhão. Atua como juiz eleitoral. É também presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe).Confira a entrevista.

IHU On-Line – O Congresso deve aprovar a lei da Ficha Limpa?

Marlon Reis – Eu não tenho dúvida de que vai aprovar. Nosso receio é de que eles fixem critérios e padrões inaceitáveis que, mesmo modificando a legislação atual, o projeto, então, não represente um ganho efetivo para a lisura do processo eleitoral.

IHU On-Line – Que mudanças podem indicar?

Marlon Reis – Alguns parlamentares falaram da necessidade de confirmação dessa decisão por outra instancia. Eu não concordo, pois isso gera uma morosidade que não vai representar nada para a sociedade. Agora, outros parlamentares têm falado que a decisão tem a necessidade da presença de um colegiado. Isso não podemos considerar um absurdo, mas nossa proposta é de que haja uma definição no âmbito de qualquer instancia do poder judiciário.

IHU On-Line – Quais as peculiaridades desse projeto?

Marlon Reis – O principal é que ele estabelece restrição às candidaturas de pessoas já condenadas pela Justiça por crimes graves, tais como estupro, desvio de verbas, tráfico de drogas e outros grandes delitos. E também impede a candidatura de pessoas que renunciaram para escapar de punições. Isso é muito comum e, segundo o projeto, essas pessoas se tornam inelegíveis por oito anos.

IHU On-Line – Se essa lei entrasse em vigor agora, quem poderia ser cassado?

Marlon Reis – Essa lei vai atingir todos aqueles que tiverem graves pendências com condenações na Justiça. Então, esse é um número impossível de explicitar. Entre os parlamentares, existem algumas pesquisas que revelam que não seria tão alto o número porque infelizmente os nossos tribunais andam muito lentamente. Mas, em compensação, há um grande número de pessoas condenadas por compra de votos, abuso de poder, desvio de verbas, falta de prestação de contas. É impossível precisar, mas o número é muito grande de pessoas que ficará de fora das eleições quando a nossa lei for aprovada.

IHU On-Line – O senhor saber dizer qual é o perfil dos políticos com “ficha suja” e que hoje transitam normalmente pelos ambientes da política brasileira?

Marlon Reis – O principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas. Infelizmente, isso é algo quase comum e aceito com uma naturalidade impressionante. Pessoas notoriamente envolvidas com desvios de verbas públicas, muitas vezes, de áreas como saúde e educação, estão aí desfilando nas colunas sociais como autoridades públicas.

IHU On-Line – Como juiz, o que esse projeto representa para a Justiça brasileira?

Marlon Reis – Representa um crescimento da igualdade. É preciso ter regras de fibra, regras que garantam a justiça no funcionamento de todos os poderes. Precisa aprimorar também o próprio Poder Judiciário, mas, certamente, os poderes públicos, cujos titulares são eleitos estão bastante atrasados na qualidade da seleção dos seus representantes.

IHU On-Line – Hoje, a legislação trata de alguma forma desse tema?

Marlon Reis – Hoje, a legislação é completamente leniente, é uma legislação que favorece a presença da política de pessoas corruptas, porque exige o trânsito em julgado dessas decisões. Mas isso não se aplica ao direito eleitoral. Então, não faz sentido o que diz a legislação hoje, pois ela abre as portas da política para criminosos.

IHU On-Line – Algumas pessoas que são contra esse projeto argumentam que o princípio da presunção de inocência do acusado contemplado no art. 5º da Constituição prevê a necessidade do trânsito em julgado da sentença judicial para a incidência da inelegibilidade. Como o senhor vê essa questão?

Marlon Reis – Essa é uma tese completamente equivocada. O principio da presunção da inocência só serve para impedir a aplicação de uma sentença criminal. Se considerarmos todo mundo inocente, a não ser que haja uma decisão condenatória penal transitando em julgado, daqui a pouco não vamos poder demitir por justa causa o empresário que atirou no seu patrão. Não se aplica a nenhum outro ramo do direito, só ao ramo penal. O direito eleitoral tem sua própria principiologia. O princípio que se espera é o princípio da precaução que está previsto na própria Constituição.

IHU On-Line – Por onde esse projeto terá que passar ainda até ser aprovado?

Marlon Reis – Bom, ele já está na Câmara, depois vai para o Senado e, depois, passa pela sanção presidencial. Nós acompanharemos cada passo para tentar garantir a maior brevidade possível. Não vamos permitir que esse projeto fique engavetado no Congresso Nacional.

Fonte: site do Instituto Humanitas Unisinos - http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_entrevistas&Itemid=29&task=entrevista&id=26255

Campanha Ficha Limpa no CQC - assista



Postado no YouTube em 13/09/09. O CQC é veiculado na TV Band

Da Folha Online - Movimento pede à Câmara pressa para votar projeto popular de "ficha limpa"

16/10/2009 - 12h32

O MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) protocolou nesta quinta-feira ofício solicitando ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), medidas para acelerar a tramitação do projeto de lei de iniciativa popular que impede a candidatura de políticos com "ficha suja" em todas as esferas de Poder.

A campanha "Ficha Limpa" é uma iniciativa do MCCE e tem o apoio da Cáritas Arquidiocesana, confederação de organizações humanitárias da Igreja Católica, e do Movimento do Ministério Público Democrático.

O projeto foi apresentado no dia 29 de setembro, data em que as 43 entidades da sociedade civil que compõem o movimento entregaram a Temer 1,3 milhão de assinaturas de eleitores brasileiros.

O MCCE apresentou os nomes do presidente da Abramppe (Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais), Márlon Reis, e do advogado Aristides Junqueira Alvarenga para que representem a sociedade quando o projeto for submetido à discussão parlamentar, o que é autorizado pelo regimento interno da Câmara.

Durante a campanha eleitoral do ano passado, a AMB (Associação do Magistrados Brasileiros) divulgou em sua página na internet a relação dos candidatos que respondiam a processos na Justiça. A iniciativa foi alvo de críticas e gerou a campanha por candidaturas de políticos com "ficha limpa".

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u638950.shtml

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

MCCE pede medidas para acelerar votação do PL da Ficha Limpa

O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) protocolou nesta quinta-feira (15/10) ofício solicitando ao presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, medidas para acelerar a tramitação do projeto de lei de iniciativa popular da Campanha Ficha Limpa, PLP 518/2009.

No documento, o movimento pede que seja dado andamento ao Projeto de Lei Complementar (PLP) 168/1993, ao qual o PLP 518/2009 foi apensado. Com essa tramitação conjunta, a matéria não precisará mais passar pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, cabendo ao Presidente Michel Temer nomear o relator para que o Plenário possa deliberar sobre o tema.

O projeto de lei de iniciativa popular foi apresentado oficialmente no dia 29 de setembro, data em que as 43 entidades da sociedade civil que compõem o MCCE entregaram a Temer 1,3 milhão de assinaturas de eleitores e eleitoras brasileiros, mas ainda não recebeu nenhuma movimentação, o que já preocupa o Comitê Nacional do MCCE. Outro ponto foi a apresentação dos nomes do presidente da Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe), Márlon Reis, e do advogado Aristides Junqueira Alvarenga para que representem a sociedade quando o projeto for submetido a discussão parlamentar, o que é autorizado pelo Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Como forma de esclarecer dúvidas, o Movimento apresentou ainda uma manifestação subscrita por diversos juristas em que se sustenta a constitucionalidade da iniciativa popular.

O PLP 518/2009 surgiu em virtude da ação que ficou conhecida como Campanha Ficha Limpa e trouxe novamente para a pauta de discussão nacional a importância da análise da vida pregressa dos candidatos que desejam concorrer a um cargo eletivo. Iniciada em abril de 2008, a Campanha Ficha Limpa quer criar critérios mais rígidos para que alguém possa se candidatar. Na prática, o PLP terá um papel preventivo, garantindo assim candidaturas idôneas no processo eleitoral. Para conhecer mais o projeto e aderir à campanha, basta visitar o site da iniciativa www.mcce.org.br.

Fonte: MCCE

De O Globo - Os desafios da Campanha Ficha Limpa

Leia em: http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2009/10/13/os-desafios-da-campanha-ficha-limpa-768031743.asp

Do Correio Braziliense - O bom exemplo e a má vontade contra o projeto da "ficha limpa"

Enquanto brasileiros comuns e magistrados, integrantes do Ministério Público e policiais estão sujeitos a restrições pela vida pregressa, deputados resistem ao projeto que exige ficha limpa


Daniela Almeida
Izabelle Torres

Publicação: 12/10/2009 09:43 Atualização: 12/10/2009 15:01

No país acostumado às concessões e ao trabalho parlamentar em benefício da própria categoria, as alterações acordadas nos bastidores para o projeto de iniciativa popular que pretende barrar a candidatura dos políticos condenados em primeira instância deve representar apenas mais um exemplo da diferença de tratamento concedida pelos legisladores a eles mesmos. Tanto que o anúncio de que pretendem impedir apenas que condenados em última instância disputem uma eleição, sob o pretexto da presunção de inocência, ignora as restrições que já são impostas a diversas carreiras profissionais. Pior. Caminha na contramão de decisões judiciais que impediram promoções de servidores e posses em cargos públicos.

Para o coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), o juiz federal Marlon Reis, as restrições impostas aos brasileiros comuns são muito mais graves, já que a exigência de vida pregressa digna, feita para determinadas carreiras, engloba mais fatores do que o conceito de antecedentes criminais tão temido pelos parlamentares. "A existência de antecedentes pressupõe a presença de condenação criminal com trânsito em julgado. Já a vida pregressa é o conjunto de informações que compõem o histórico pessoal de cada um. Mesmo fatos desabonadores da vida social e a prática de ilícitos civis integram o conceito legal de vida pregressa. É um conceito bem mais amplo do que a proposta do projeto de lei de inciativa popular e várias categorias se submetem a ele", argumenta Reis.

O nível de exigência dos órgãos judiciais com a vida pregressa dos brasileiros comuns pode ser constatado em uma sequência de ações julgadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e por órgãos de primeira instância. No caso dos policiais, por exemplo, três decisões da suprema Corte, tomadas por diferentes ministros, determinaram que a não promoção de policial militar sob alegação de que responde a uma ação penal - ainda não julgada - não representaria uma afronta ao princípio da presunção de inocência. Ou seja, enquanto políticos trabalham para que as restrições às candidaturas só aconteçam quando as acusações contra eles tiverem esgotado todos os recursos, o STF tem decidido ao longo dos anos que policiais apenas acusados em processos podem não ser promovidos por conta das suspeitas.

A aplicação dos princípios do contraditório e da ampla defesa - tão citados pelos parlamentares quando o assunto é impor restrições às candidaturas políticas - também recebe interpretações do STF que em nada beneficiam aspirantes a cargos públicos com qualquer pendência judicial.

Em 1995, ao julgar recurso extraordinário originário de São Paulo, o ministro Marco Aurélio Mello decidiu que as sindicâncias sobre a vida pregressa de quem pretende ocupar uma vaga no serviço público não requer a aplicação do princípio da ampla defesa e do contraditório.

A decisão de Mello foi repetida em maio do ano passado, quando o ministro Alberto Direito relatou recurso extraordinário originário do Ceará e afirmou que o precedente da Corte indicava que não havia obrigatoriedade da aplicação desses princípios em casos de investigação sumária sobre a vida pregressa de candidatos a concursos públicos. "Esses casos ilustram bem o fato de que as restrições à participação em concursos no Brasil não são baseadas nos antecedentes criminais, mas em um conceito mais amplo de vida pregressa. Por isso, é tão comum que as seleções realizem sindicâncias da vida pregressa dos aspirantes a diversas carreiras", ressalta Marlon Reis.

Profissionais
Além das decisões judiciais que comprovam o tratamento diferenciado que os parlamentares articulam conceder para eles mesmos, algumas carreiras possuem resoluções e diretrizes que impõem diferentes restrições. O Conselho Nacional de Justiça editou uma resolução em maio deste ano, determinando a obrigatoriedade de uma fase de sindicância da vida pregressa e investigação social em todos os concursos para juízes federais e estaduais. Outra resolução, esta do Conselho Nacional do Ministério Público, dispõe que antes da inscrição definitiva no concurso para ingresso na carreira no MP será realizada uma fase de diligências sobre a vida pregressa dos candidatos.

Há também exigências de conduta moral para interessados em exercer atividade notarial e para os bacharéis em direito interessados em se inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil. "A proposta do projeto de lei de iniciativa popular que apresentamos pretende colocar os brasileiros em condições iguais e exigir que nossos representantes também sejam submetidos a restrições quando sua conduta não for condizente com a moral e a ética", conclui o representante do MCCE.
» Leia a íntegra do projeto de lei sobre iniciativa popular

Veto ao crime
O projeto de iniciativa popular é uma prerrogativa constitucional para que a sociedade participe de decisões legislativas e possa propor leis. Para isso, é obrigatória a apresentação das assinaturas de 1% dos eleitores brasileiros divididos entre cinco estados, com não menos de 0,3% do eleitorado de cada unidade da Federação. A proposta apresentada pelo MCCE no último dia 24 contou com a assinatura de 1,3 milhão de brasileiros e propõe a proibição de candidatura a cargos eletivos de qualquer pessoa condenada em primeira instância. No caso de crimes de improbidade administrativa, diz que o impedimento deve acontecer a partir do recebimento da denúncia por um órgão colegiado de qualquer instância.

Regras muito mais rigorosas
Políticos querem privilégios enquanto diferentes categorias profissionais no Brasil se submetem a exames de conduta da vida pregressa. Conheça as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto

REGRAS E LIMITAÇÕES
- Resolução nº 75, de maio de 2009, do Conselho
Nacional de Justiça: prevê a obrigatoriedade de uma fase de sindicância da vida pregressa e investigação social em todos os concursos para juízes federais e estaduais

- Resolução n° 14, de novembro de 2006 do
Conselho Nacional do Ministério Público: define que antes da inscrição definitiva no concurso será realizada uma fase de diligências sobre a vida pregressa do candidato a uma vaga no MP, assegurando-lhe ampla defesa

- Lei nº 6.815, de agosto de 1980: diz que o Ministério da Justiça só emitirá parecer sobre a conveniência da naturalização após averiguar a vida pregressa do naturalizando.

- Lei nº 8.395, de novembro de 1994: determina que a delegação para o exercício da atividade notarial de registro depende da investigação da vida pregressa do candidato

- Lei nº 8.906, de julho de 1994: estabelece que a idoneidade moral é requisito para a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

- Recurso Extraordinário 156400, relatado pelo ministro do STF Marco Aurélio Mello, em 1995, e Recurso Extraordinário 233303, relatado pelo falecido ministro do STF Menezes Direito em 2008: em ambos os casos, os ministros decidiram que não é obrigatória a aplicação do princípio da ampla defesa e do contraditório às sindicâncias sobre a vida privada em concursos públicos

- Recurso Extraordinário 459320, relatado pelo ministro Eros Grau em 2008 e Recurso Extraordinário 356119, relatado pela ministra Ellen Gracie em 2002: Em ambos os casos os ministros decidiram que não ofende a presunção de inocência a não promoção de policial militar por estar respondendo a ação penal.

Fonte: Levantamento realizado pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE)

Má vontade
O projeto de lei complementar Ficha Limpa precisa ainda passar por um longo caminho antes de ser aprovado. De acordo com os integrantes do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MMCE), um dos maiores problemas é o fato de o projeto estar ainda sem relator na Câmara dos Deputados. "A nossa principal preocupação é que o projeto ande. Existem projetos semelhantes no Congresso desde 1993, como o PLP 168/93, que já falava de inelegibilidade em primeira instância", alerta Marlon Reis, presidente da Associação Brasileira de Magistrados Procuradores e Promotores Eleitorais.

Só na Câmara dos Deputados, o Ficha Limpa tem de ser distribuído às comissões, passar por análise e ser aprovado pela maioria absoluta no plenário. A escolha do relator, o que poderia acelerar a tramitação da matéria, por exemplo, só acontece na Comissão de Constituição e Justiça. Depois de passar pela Câmara, o projeto vai para o Senado e, caso não sofra nenhuma alteração, segue para a assinatura do presidente Lula.

Muitos deputados já apontaram a "necessidade" de alterações relevantes no projeto. Os pontos mais polêmicos têm a ver com a condenação em primeira instância e o acato de denúncia formal do MP por qualquer tribunal, o que significa que processos criminais por improbidade administrativa, tráfico de drogas, estupro, homicídio, desvio de verbas e mesmo a renúncia a mandatos por abertura de inquérito seriam o suficiente para tornar os políticos inelegíveis por oito anos, mesmo não havendo condenação.

O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB/SP), defendeu que a futura lei só deveria ser aplicada depois de uma decisão colegiada, ou seja, em segunda instância. Para Marlon Reis, presidente da Associação Brasileira de Magistrados Procuradores e Promotores Eleitorais, organização que integra o MCCE, o caso é questão de interpretação. "Colegiado não quer dizer segunda instância, já que quem tem foro privilegiado, ou seja, políticos cumprindo mandato, exceto vereadores, são julgados por tribunais com colegiado", disse.

Outro deputado que já se manifestou contra o projeto de lei complementar foi José Genoíno (PT-SP), que responde no Supremo Tribunal Federal (STF) a ação penal relacionada ao caso do Mensalão. Na opinião do deputado, "o projeto é autoritário e antidemocrático".

"Essa lei nega o princípio universal da democracia de que só pode existir culpa após o julgamento definitivo. Está na Constituição de 1988 e na declaração dos direitos universais da ONU, só pode ser considerado culpado quem for julgado. Ela reflete uma lei complementar da Constituição da ditadura de 1969, a qual considerava inelegível quem sofria denúncia por corrupção ou subversão. Era assim que a ditadura cassava mandato. Quem julga o candidato é o povo. O poder emana dele".

Humberto Souto (PPS-MG), um dos deputados que assumiu a co-autoria do projeto com o objetivo de acelerar sua tramitação na Casa, alerta que a matéria foi anexada a outros sete projetos e está quase ganhando a tramitação comum, o que pode atrasar a aprovação da iniciativa popular. "Deram uma tramitação de projeto comum, mas queremos que ela tramite como uma proposta popular. Vamos até o presidente (da Câmara) para mostrar que o projeto tem um apelo diferente. Precisamos fazer um movimento, pois queremos já aplicar a lei no ano que vem. Para isso, tem que tramitar rapidamente", disse Souto.

Para Marlon Reis, a campanha Ficha Limpa não termina na entrega do projeto de lei na Câmara. "Se o Congresso quiser barrar essa matéria terá surpresas. Vamos divulgar e informar a sociedade, criar estratégias de mobilização, vigílias em frente ao Congresso para acompanhar a tramitação etc. Tudo o que for válido do ponto de vista lícito, nós faremos", promete.

Fonte: http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2009/10/12/politica,i=147801/O+BOM+EXEMPLO+E+A+MA+VONTADE+CONTRA+O+PROJETO+DA+FICHA+LIMPA.shtml

Do Estadão - "Presunção de inocência é para o direito penal"

Segunda-Feira, 12 de Outubro de 2009.

Organizador da campanha Ficha Limpa diz que sociedade tem direito de estabelecer critérios para um político se candidatar

Daniel Bramatti

Uma das principais vozes do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Marlon Reis foi um dos organizadores da campanha Ficha Limpa, que, em pouco mais de um ano, coletou 1,3 milhão de assinaturas em defesa do projeto que proíbe a candidatura de políticos condenados pela Justiça. Reis, que é juiz eleitoral e comanda a Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe), diz estar confiante na aprovação da proposta no Congresso e destaca que serão poucos os parlamentares atingidos pela medida.

O projeto de iniciativa popular foi protocolado na Câmara no final de setembro. Deverá ser votado até junho do ano que vem, prazo final de registro das candidaturas, para que possa valer na eleição de 2010, segundo o entendimento de alguns especialistas.

Para ele, o princípio da presunção de inocência, que impede a punição de um acusado antes de esgotadas todas as instâncias de defesa, não pode ser invocado quando se trata de políticos e eleições. "Inelegibilidade não é pena, é critério", argumenta. Abaixo, a entrevista.

De acordo com o projeto, o que define um ficha-suja?

A ideia é que as decisões condenatórias sobre alguns crimes sejam suficientes para impedir candidaturas, ainda que provisoriamente. E digo provisoriamente porque, desde que o político consiga reverter posteriormente o julgado, ou que cumpra toda a pena e ultrapasse o período de inelegibilidade, ele poderá voltar a concorrer. Há muitas dúvidas sobre algumas questões mais básicas.

Quais?

Primeiro, são alguns crimes específicos. Os delitos de menor potencial ofensivo e coisas que não são verdadeiramente infamantes não estão presentes no projeto. Os critérios de proteção para evitar o afastamento de pessoas de forma leviana são esses: a necessidade de que sejam ações movidas pelo Ministério Público e não por particulares, a necessidade de que haja uma condenação, e de que essa condenação seja por certos delitos que chamam a atenção da sociedade por sua conexão negativa com o eventual exercício de um mandato. Por exemplo, um homicídio culposo por conta de um acidente de trânsito - por mais graves que possam ser as circunstâncias - a gente não colocou no projeto. Homicídio doloso, sim. São apenas crimes de ação penal pública, ou seja, nos quais só o Ministério Público pode oferecer denúncia. Isso é para evitar justamente que pessoas movam ações contra adversários para evitar que se candidatem.

Como o sr. vê o argumento de que não é correto impedir uma candidatura de alguém sem a condenação em última instância? O projeto ignora a presunção de inocência?

Dentre as entidades que fazem parte do movimento estão muitas que lutaram para que nós tivéssemos hoje o reconhecimento do princípio da presunção de inocência. Mas esse princípio é de aplicação exclusiva ao direito penal. Foi criado para impedir casos que aconteciam no passado, em que se impunham penas criminais a pessoas que ainda tinham direito de defesa.

Pode citar exemplos?

Se o princípio fosse aplicado ao direito do trabalho, por exemplo, um empregado que tentasse matar o patrão não poderia ser demitido por justa causa antes que se julgasse a sentença penal condenatória. Nesse exemplo, o empregado não pode é ser preso e cumprir pena antes da sentença final, mas a demissão é imediata. Imagine uma pessoa que tenha sofrido condenação, apenas em primeiro grau, por haver violentado crianças. Ele poderia participar de um concurso público para professor de uma creche? Nesse caso, que é de direito administrativo, não há dúvida de que ele seria impedido de participar. Por isso é que, nos concursos públicos, se exigem as certidões criminais. Outro exemplo: o juiz da Infância e da Juventude submete aquele que pretende adotar uma criança a um estudo intensivo. E não se avaliam apenas aspectos criminais, mas até a personalidade da pessoa. Se paira contra ela uma denúncia que gerou condenação em primeira instância por crime sexual, o juiz jamais poderia conceder essa adoção. Eu poderia citar aqui todos os ramos do direito, com exceção do penal, e o princípio de presunção de inocência não se aplicaria. Na questão eleitoral também não se aplica. A inelegibilidade não é uma pena, é um critério. A sociedade pode estabelecer os critérios para a elegibilidade. Hoje se diz que devem ser pessoas maiores de idade, alfabetizadas, sem contas rejeitadas. E nós queremos apenas acrescentar mais um critério como requisito para a candidatura: que não tenham sentenças condenatórias por crimes graves.

O senhor tem ideia de quantas pessoas seriam atingidas no Congresso por uma lei como essa?

Até acho que pouca gente. Infelizmente, no Supremo Tribunal Federal, onde os membros do Congresso Nacional têm foro privilegiado, jamais houve qualquer condenação. O temor apresentado por alguns parlamentares chega a ser desarrazoado, pois o foro privilegiado tem servido como uma grande cobertura para eles.

Mas o simples acatamento de uma denúncia não poderia impedir uma candidatura?

Sim, mas nisso nós estamos dispostos a ceder. Não vamos exigir isso na redação final. Colocamos esse ponto como forma de chamar a atenção sobre a seriedade do tema. Mas estamos preocupados é com os princípios do projeto e não com a preservação da redação original. Para preservar o aspecto de que pessoas condenadas sejam impedidas de se candidatar, estamos dispostos a abrir mão da exigência de que pessoas com denúncias nos tribunais também fiquem de fora. É um ponto negociável.

Se os parlamentares não devem sofrer prejuízos, a quem a lei vai atingir?

Muitos prefeitos condenados por desvios de verbas. Nem tanto os atuais mandatários, mas muitos do que pretendem se candidatar no ano que vem serão impedidos.

Por que os próprios eleitores não vetam os fichas-sujas?

Isso se dá porque se desenvolveu na sociedade a noção de que a política é uma atividade para pessoas sem escrúpulos. Há uma desilusão e isso faz com que se tolerem pessoas que não deveriam estar na política. Muita gente pensa que nosso principal objetivo é o projeto de lei, mas nunca foi. O principal objetivo é levantar esse debate. Cada uma das 1,3 milhão de assinaturas que nós coletamos foi de uma pessoa que teve de ser esclarecida sobre do que se tratava. Nós estávamos na base da sociedade promovendo uma mudança de postura em relação à política. A campanha que sempre foi voltada para a educação da sociedade e para a dignificação da política.

Qual foi a trajetória até chegar a 1,3 milhão de assinaturas?

O primeiro passo foi a aprovação do projeto pela CNBB. A decisão de lançar a campanha Ficha Limpa foi aprovada no dia 10 de dezembro de 2007, em uma reunião ocorrida na sede do Conselho Federal da OAB. Em maio de 2008 nós apresentamos o projeto na assembleia-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. E lá foi aprovado por unanimidade.A partir daí começou a coleta de assinaturas, por meio da capilaridade das 43 organizações que fazem parte do MCCE.

Houve dificuldades?

Nós enfrentamos muitas dificuldades. No começo, havia muita resistência por conta da questão da presunção de inocência, mas nós fomos vencendo isso. No final da campanha, já não havia problema nenhum. Foi muito importante para isso o apoio de grandes juristas, que declararam a constitucionalidade do projeto, como Aristides Junqueira, Celso Antonio Bandeira de Mello, Fábio Konder Comparato, entre outros. Outro percalço que tivemos foi o medo da população em alguns locais. No interior do Maranhão um padre me disse que não estava conseguindo assinaturas porque as pessoas tinham medo do prefeito, que tinha várias condenações e era tido como uma pessoa violenta. Nas favelas do Rio de Janeiro e na Baixada Fluminense ocorreu a mesma coisa.


Fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20091012/not_imp449439,0.php

Artigo da Folha de São Paulo - Ficha suja, por Ferreira Gullar

Folha de São Paulo, 11.10.2009

FERREIRA GULLAR

Ficha suja


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Para o STF, um acusado será tido por inocente até ser julgado em última instância


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O CONGRESSO Nacional, um dos três poderes da República, cuja função é legislar, criar leis que devem reger a vida da sociedade brasileira, legisla com frequência em causa própria.

Por exemplo, caso um deputado ou um senador, levado à comissão de ética, for considerado culpado, seu caso será submetido à apreciação do plenário que poderá cassar-lhe o mandato. Se isso ocorrer, ele ficará oito anos sem poder candidatar-se de novo. No entanto, o regimento admite que, se antes da decisão do plenário ele renunciar ao mandato, poderá candidatar-se às próximas eleições. Falando francamente, trata-se de uma farsa, para garantir a impunidade dos parlamentares. Se a intenção fosse de fato punir, ele não poderia voltar a se candidatar, uma vez que traiu a confiança do eleitor e a ética. Quem não é confiável não pode criar leis para reger a cidadania.

Os exemplos são muitos. Além de admitir que o parlamentar desonesto escape à punição, criou-se, para os senadores, a figura do suplente, ou seja, o senador não eleito. Se o titular se licencia, torna-se senador da República alguém que não recebeu voto de ninguém. E por que isso? Trata-se de um simples descuido? Claro que não; trata-se, na verdade, de mais uma esperteza para favorecer os próprios senadores que, desse modo, dividem o mandato que o povo lhes concedeu com o financiador de sua campanha ou com um sócio ou com a própria mulher. Como no caso das passagens aéreas -que distribuíam a parentes e amigos-, o mandato lhes pertence como o dinheiro que têm no banco: podem usá-lo ou reparti-lo com quem quiserem. Hoje, dos 81 senadores, quase 30 lá estão sem terem sido eleitos por ninguém.

Coerentemente com essa necessidade de manter-se "fora da lei", os parlamentares resistem a impedir a candidatura de quem tem ficha suja. E por várias razões, sendo a primeira delas a possibilidade de que, amanhã, por algum motivo, tenha ele próprio que se defrontar com a Justiça. Por isso que o mandato parlamentar é, para ele, fundamental, já que o torna imune à lei; a ele e à patota de cabos eleitorais, que constituem sua máquina de sustentação e que também aspiram a cargos eletivos. Esses cargos não apenas significam poder e meio de enriquecimento como, sobretudo, garante-lhes a impunidade, razão por que para conquistá-los pisam até no pescoço da mãe.

Eles são como uma família, no sentido mafioso do termo, onde ficha limpa mesmo é coisa rara, muito embora a palavra candidato derive de "cândido", que significa limpo, sem mácula. Vá falar isso numa roda de políticos e eles cairão na gargalhada e com toda a razão.

Não obstante tudo isso, um grupo de instituições e pessoas que ainda acreditam no país levaram ao Congresso um documento com 1.300.000 assinaturas, exigindo que se proíba, já nas próximas eleições, a candidatura de pessoas condenadas em primeira instância por crimes graves. A esta altura, não sei em que pé as coisas estarão, mas, ao receber o documento, o presidente da Câmara de Deputados já se mostrou contrário ao impedimento de quem foi condenado em primeira instância. Sugere que o seja em segunda instância. Em face da morosidade de nossa Justiça, até que o sujeito condenado em primeira instância seja julgado na segunda, terão se passado anos e ele já se elegeu deputado e ganhou imunidades.

A raiz desse problema está, de fato, na interpretação que dá o Supremo Tribunal ao dispositivo constitucional, segundo o qual todo mundo é inocente até prova em contrário. Para o STF, um acusado será tido por inocente até ser julgado em última instância. Ora, se o recurso de uma condenação de primeira instância leva anos para ser apreciado na instância seguinte, imagine o tempo que levará para chegar à última instância.

Afora isso, atrevo-me a afirmar que a interpretação do STF, data vênia, é, no mínimo, discutível. Se a Constituição diz que todo mundo é inocente até que seja provada sua culpa, cabe à Justiça decidir se as acusações imputadas a alguém são procedentes, se ele é inocente ou não. Logo, se o acusado for condenado em primeira instância, passará de inocente a culpado. Afirmar que, depois de condenado, continua inocente, equivale a dizer que o julgamento de primeira instância não conta, nem o das instâncias seguintes. É um contrassenso que resulta, de fato, na anulação da Justiça.

Na verdade, ao ser condenado em primeira instância, o acusado torna-se culpado perante a Justiça. Pode recorrer da decisão, mas, agora, na condição de sentenciado, não mais de inocente.


Fonte: Folha de São Paulo - http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1110200922.htm

Artigo do Zero Hora - Ficha Limpa

Por Antônio Mesquita Galvão*

Depois do caso Sarney, da casa da governadora e outros acontecimentos, eu evito comentar sobre política, tamanho o enojamento que me assalta. Mas um fato não é possível deixar passar, pois mais do que político, inflete no terreno da cidadania. Trata-se do registro de candidaturas de indivíduos que têm ocorrências policiais ou judiciais dependentes de sentença. É a chamada “ficha suja”, mais conhecida como “pau de galinheiro”.

Para trabalhar em um banco, dar aulas numa universidade, a pessoa tem que ter a ficha limpa. Com maus antecedentes não entra! O cara, para conseguir um emprego de motorista de uma empresa ou de vigilante particular, tem que comprovar a inexistência de processos e fatos afins. E para o Congresso? E para as Assembleias, Câmaras, governos estaduais e prefeituras? Sabem que não precisa comprovar nada? O pior é que os antecedentes revelam os consequentes.

O pior é que muitos indivíduos não buscam a eleição para exercer um serviço cívico, pelo bem comum, mas para “se arrumar”, entrar no “jabaculê”, fazendo acordos de campanha, conchavos e negociatas.

Só para citar apenas um caso grotesco, recordo que, na década de 90, um deputado federal nortista (com ficha suja) ficou famoso nacionalmente. Na época, ele esmurrou uma deputada em plena Câmara porque ela o acusou de lenocínio e tráfico de cocaína. Ela (com uma vida pregressa diferente de Madre Teresa) foi cassada em 1994 pela CPI dos “anões do orçamento”. Esses dois, entre tantos, não podiam ter sido diplomados. Uma turma dessas, depois de eleita, vai postular os interesses de quem?

O pior é que, depois de eleito o meliante, as im(p)unidades e o corporativismo existentes na política não deixam mais cassá-lo. O esprit de corps fala mais alto. A solidariedade das bancadas e a conivência dos partidos, tudo ajuda a trazer o descrédito sem precedentes que se abate sobre a política nacional.

Esperar pelo braço cego e sonolento da Justiça não adianta. Os processos se arrastam por décadas, enquanto o pessoal da mão ligeira vai avançando nas fichas. No Rio Grande do Sul, a Justiça apregoa, pelo rádio, a formação de uma “força-tarefa” para agilizar processos estagnados desde 2004. Ora, se está levando quatro a cinco anos para julgar, deve ser o mesmo tempo em que o indiciado se elege, dá trambiques, forma a quadrilha e depois ninguém mais bota a mão nele, não pode mais ser punido, pois assume todas as imunidades regimentais.

É preciso que se faça uma campanha nacional pela obrigatoriedade da “ficha limpa”. Se quem não tem antecedentes já se corrompe na campanha aceitando propinas, imóveis, carros, caixa 2, imaginem quem já é do ramo! O danado é que essas leis são feitas pelo mesmo Congresso que é o favorecido direto pelas facilidades.


*Filósofo e escritor


Fonte: Jornal Zero Hora - http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2681154.xml&template=3898.dwt&edition=13292§ion=1012