quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Artigo - Mandacaru florido e ficha limpa

Por Maria Clara Lucchetti Bingemer*

O Congresso recebeu recentemente uma proposta para impedir a candidatura dos políticos com a ficha suja na Justiça. O projeto tem apoio de 1,3 milhão de assinaturas.

Os documentos com as assinaturas foram colocados em frente ao Congresso Nacional. É o resultado do esforço de voluntários de vários pontos do país, que percorreram com grande sacrifício zonas inóspitas em busca das assinaturas para dar força e credibilidade à proposta e esperança de que seja aprovada.

À Frente da coleta de assinaturas está o Movimento Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral (MNCCE), do qual faz parte a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

A palavra desta se fez ouvir pela boca de seu secretário-geral, Dom Dimas de Lara Barbosa: “O nosso objetivo é lutar cada vez mais pela ética na política e a ética no trato da coisa pública”.

Faz sentido. Se o Evangelho, de cujo anúncio a Igreja é encarregada e portadora, pretende instaurar o Reino da paz e da justiça, a luta política, por uma polis onde reine o bem e de onde a corrupção esteja cada vez mais banida e extraditada deve ser um componente constitutivo e constante.

O projeto proíbe que políticos que já tenham uma condenação em processo proposto pelo Ministério Público disputem eleições. A regra valerá para condenações em segunda instância por crimes graves, tais como corrupção, desvio de verba pública, tráfico de drogas, homicídio e estupro. “O objetivo da sociedade brasileira, expressada nesse projeto de iniciativa popular, é realizar profundas mudanças no cenário eleitoral, permitindo que, cada vez mais, a política seja identificada como uma atribuição para pessoas de bem”, explicou Marlon Reis, do Movimento Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral.

Como suspira e deseja o Brasil chegar a esse ponto em que a política seja, de fato, o exercício da arte de praticar o bem, de administrar harmoniosamente os bens da criação e exercer o poder como serviço da justiça e da paz. Os últimos e lamentáveis episódios que afogaram o Senado - que deveria ser a mais respeitável das casas - num mar de lama inimaginável e lamentável colocaram esse ideal a uma distância aparentemente inalcançável.

Há um travo amargo e descrente na boca de cada brasileiro que vê seu país mergulhar cada vez mais fundo no descrédito feito de irresponsáveis e nefastos conluios e a cada dia desperta lendo nos jornais uma notícia mais hedionda de novas catástrofes éticas, não sabendo mais em quem confiar, para onde dirigir seu voto, a quem encarregar de governar seu país.

A notícia de que o projeto da ficha limpa conseguiu recolher mais de um milhão de assinaturas é alentadora e refrescante como a brisa suave de que fala a Bíblia judaica que sinalizava a presença de Deus para o profeta Elias. O ar se purifica, respira-se melhor, os olhos voltam a brilhar. Faz bem sabermos que a sociedade civil não está totalmente passiva e abúlica, resignada a deixar-se afogar em lama e podridão. E que a Igreja volta a assumir seu papel profético no seio dessa sociedade.

Mas, não vamos negar, faz mais bem ainda ver os cidadãos comuns, simples, os eleitores, trabalhadores, pessoas honestas e honradas que só têm por si sua dignidade e sua honestidade, se levantando e clamando por seus direitos, com esforço e sacrifício. Vamos admitir: é de arrepiar ouvir o comovente depoimento de Arimatéia Dantas, do Piauí, que dá bem a medida do que foi essa mobilização voluntária: “Nós percorremos o calor do Piauí, e era um sofrimento, tinha lugares que só tinha mandacaru e a gente colhendo assinaturas”.

Como no xote de Luis Gonzaga, “mandacaru quando `fulora` na seca é sinal que a chuva chega no sertão.” Só tinha mandacaru, mas mandacaru floresceu com a chegada dos voluntários que colhiam assinaturas porque acreditam que o Brasil pode mudar e ser governado por políticos de ficha limpa. Ave Arimatéia, Dom Dimas e todos que levaram adiante essa campanha. E esperemos que o Congresso esteja à altura e colabore nessa floração tão desejada e esperada.

*Teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio.

Fonte: Jornal A Hora Online - http://www.jornalahoraonline.com.br/coluna.php?id=3144

Do Estadão - Projeto da ficha limpa enfrenta resistência no Congresso

SÃO PAULO - O projeto de lei de iniciativa popular nº 518/09, que pode ser levado a votação no Congresso e estabelece a ficha limpa - que prega a rejeição de voto para os políticos com processos na Justiça - como regra para registro de candidatura, enfrenta resistência entre os parlamentares. Um mês após ser entregue na Câmara, a Mesa Diretora ainda não nomeou um relator. A proposta foi anexada ao projeto 168/93, que também trata de casos de inelegibilidades e já recebeu parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) quanto à sua constitucionalidade - queimando assim, etapas na tramitação interna.

Mas para que comece a efetivamente ser analisado pela Casa, o projeto precisa ter nomeado um relator pela Mesa e conseguir romper a rejeição que enfrenta por prejudicar diretamente 41% dos deputados atuais. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que encabeçou a coleta de assinaturas, tenta pressionar os parlamentares para que o maior número deles subscreva o texto - 31 já o assinaram. Para isso, a ONG, que agrega outras 41 entidades, lançou a campanha "Mande um recado aos parlamentares!", em que orienta os eleitores a mandarem e-mails para os deputados cobrando a aprovação da lei da ficha limpa.

O tema já foi debatido no Supremo Tribunal Federal (STF) nas eleições municipais de 2008, quando a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) preparou uma lista de candidatos com problemas na Justiça. Após sete horas e meia de sessão, 9 dos 11 ministros da Corte votaram contra uma ação protocolada pela AMB, que pedia que os candidatos condenados em primeira instância fossem impedidos de disputar as eleições. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,projeto-da-ficha-limpa-enfrenta-resistencia-no-congresso,460359,0.htm

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Do Estadão - ONGs anticorrupção se mobilizam para renovar 60% do Congresso

Terça-Feira, 03 de Novembro de 2009 Versão Impressa


Objetivo da ofensiva é barrar eleição de candidatos com ficha suja e elevar qualidade da representação parlamentar

Ricardo Brandt

A meta é ambiciosa: conseguir a renovação de 60% dos deputados e senadores do Congresso Nacional nas eleições de 2010. A um ano do pleito, as principais entidades civis de combate à corrupção do País começaram a trabalhar para barrar o maior número de candidatos com problemas na vida pregressa e tentar coibir fraudes e desvios na campanha.

Entidades como o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Transparência Brasil, Contas Abertas, Voto Consciente, Amigos Associados de Ribeirão Bonito (Amarribo), entre outras, se organizam para entrar nas eleições de 2010 com uma campanha massiva na internet para elevar a qualidade da representação parlamentar do País. Os trabalhos vão desde a seleção dos nomes dos candidatos com ficha suja, que já está sendo preparada, aos relatórios de desempenho da atividade legislativa dos que já ocupam cargos no Congresso, tabelas de gastos com verba indenizatória, quadro de doadores de campanha, emendas apresentadas ao Orçamento entre outras.

Considerada pelas organizações não-governamentais a principal ferramenta para a conquista de uma renovação recorde no Congresso, a campanha da ficha limpa - que prega a rejeição de voto para os políticos com processos na Justiça - será usada pela primeira vez para a escolha dos 513 deputados e 54 dos 81 senadores no próximo ano. Nas últimas eleições, o índice de novos parlamentares eleitos do Congresso foi de 45% (em 2006) e de 41% (em 2002). Só em 1990 foi registrada renovação de 62%, mas apenas na Câmara.

A ideia é que, mesmo que não vire lei, a ficha suja sirva como filtro para escolha dos eleitos. "As pessoas acompanham tantos escândalos na política e às vezes ainda não sabem separar os bons dos ruins. Não achamos que todo político é desonesto. Mas sabemos que existe uma classe desqualificada e desonesta, e que as pessoas não querem mais votar nela. Há uma tendência de se votar em novos nomes", afirma Rosângela Giembinsky, uma das coordenadoras do Voto Consciente, uma ONG que, desde 1987, monitora e avalia o trabalhos dos parlamentares da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal de São Paulo.

Atualmente, levantamento feito pelo projeto Excelências da Transparência Brasil mostra que, dos 513 deputados, 208 têm problemas com a Justiça ou com os tribunais de contas - 41%. No Senado, dos 81 parlamentares, são 29 - 36%.

"A grande novidade das eleições de 2010 vai ser uma sociedade desatrelada de partidos políticos e com os olhos voltados para a vida pregressa dos candidatos, para os casos de corrupção e compra de votos", diz o juiz eleitoral Marlon Reis, um dos fundadores do MCCE e presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais.

Para isso, o material de pesquisa elaborado pelas entidades para ajudar o eleitor a escolher melhor seu candidato ficará (boa parte já está) disponível nos sites de mais de 200 ONGs já cadastradas.

CRITÉRIO DE CORTE

A proposta de criar a ficha limpa como critério de corte para candidaturas de políticos com condenação em primeira instância por crimes graves ou contra a administração pública com processo ainda em trâmite na Justiça foi inicialmente formalizada nas eleições municipais de 2008 pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Na ocasião, o pedido foi rejeitado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Mesmo assim, ela foi amplamente divulgada pelas entidades civis e pela imprensa.

Para as eleições de 2010, a ficha limpa pode virar lei. O MCCE obteve, após um ano e meio de coleta de assinaturas, 1,3 milhão de apoiadores, o que permitiu que ela fosse enviada ao Congresso em forma de projeto de lei de iniciativa popular.

"O MCCE não vai deixar que esse projeto seja engavetado. Já enviamos mais de 250 mil e-mails para o Congresso e se precisar vamos fazer uma vigília cívica em Brasília para que essa regra apoiada por mais de 1 milhão de pessoas seja votada", afirmou Marlon Reis.

O cientista político Alberto Carlos Almeida, autor de duas obras que se tornaram referência no segmento político-eleitoral (A Cabeça do Brasileiro e a A Cabeça do Eleitor), faz uma crítica, no entanto, ao conteúdo do discurso das entidades. "A discussão não é usada da forma correta. Falta conectividade. O discurso tem de ser: "você paga muito imposto no Brasil porque tem muita corrupção"", explica. "É preciso deixar de tratar a corrupção como um problema ético. É uma questão pragmática, para as pessoas passarem efetivamente a se interessar em resolver a questão, é preciso mostrar que isso encarece seu custo de vida."


ONDE SE INFORMAR

Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE)


Elaborou projeto de lei para barrar os fichas-sujas. Realiza também pesquisas em bancos de dados para avaliar cassações

www.mcce.org.br

Transparência Brasil

Fundada em 2000, formou banco de dados de fácil acesso na internet com informações sobre o Legislativo de todo o Brasil. Coleta informações, documentos, registros eleitorais

www.transparencia.org.br

Contas Abertas

Faz levantamentos de gastos dos parlamentares, disponibiliza planilhas com uso de verbas indenizatórias, gastos de emendas, aplicações de recursos tanto do Legislativo como do Executivo

www.contasabertas.uol.com.br

Voto Consciente

Movimento fundado em 1987, em São Paulo, para acompanhar e fiscalizar ações na Câmara Municipal e na Assembleia Legislativa

www.votoconsciente.org.br

Amigos Associados de Ribeirão Bonito (Amarribo)

Entidade do interior de Minas Gerais que congrega centenas de outras organizações de combate à corrupção em todo o País

www.amarribo.org.br


Fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20091103/not_imp460249,0.php