Novos padrões
Gaudêncio Torquato
Jornalista e professor(USP) - gt@gtmarketing.com.br
John Stuart Mill classificava os cidadãos em ativos e passivos, aduzindo que os governantes preferem os segundos, mas a democracia necessita dos primeiros. A comparação, pinçada por Norberto Bobbio em seu livro "O Futuro da Democracia", expressa, ainda, a ideia de que os súditos são transformados num bando de ovelhas a pastar capim uma ao lado da outra. Ao que Bobbio acrescenta: "Ovelhas que não reclamam nem mesmo quando o capim é escasso". Pois bem, por estas bandas, apesar do capim farto, equinos, caprinos e bovinos rompem o cabresto e saem dos currais. E mais, não querem ser comparados a animais irracionais e dóceis. A notícia boa é que a imagem acima desvenda um Brasil cidadão que decidiu expurgar o passado do voto amarrado à distribuição de benesses e à opressão dos senhores feudais da política. Nos últimos tempos, movimentos e decisões nas esferas judiciária e parlamentar denotam que o país passou a aplicar parâmetros racionais no campo eleito ral, proibindo de maneira rigorosa práticas ilícitas da compra de voto.
Manifestação dessa saudável corrente de pensamento foi a entrega à Câmara dos Deputados do projeto de lei de iniciativa popular, assinado por 1,3 milhão de eleitores, que trata da proibição de candidaturas de pessoas com condenação na Justiça. Não passa despercebido o fato de que o feito se dá exatamente por ocasião do 10º aniversário da lei nº 9.840, também de iniciativa popular, que versa sobre o combate à corrupção eleitoral. Essa lei é responsável pela cassação de 238 prefeitos eleitos em 2008 e pelo afastamento, este ano, dos governadores da Paraíba, Maranhão e Tocantins.
Os dois eventos sinalizam a emergência da sociedade participativa, fenômeno observado também na miríade de entidades que desfraldam bandeiras, enchendo praças, ocupando os salões de Casas congressuais e fazendo ecoar um grito cívico. Ao mesmo tempo que novos polos de poder se movimentam, empurrando as demandas sociais e os pleitos corporativos em direção aos três Poderes da República, estes, absorvendo as massas de pressão, reagem com decisões consentâneas à nova moldura.
Em algumas áreas, os avanços são notáveis. O ativismo da mais alta Corte eleitoral, ao contrário do que muitos apregoam, não deve ser entendido como invasão despropositada na esfera política. Se ocorreu, em algum momento, ruído a apontar interposição de funções, seguramente o fato se deveu à omissão do parlamento.
Não há, porém, como negar: o país, de maneira lenta e gradual, tem aperfeiçoado os padrões da política. Nos últimos nove anos, a primeira instância da Justiça Eleitoral indicou a cassação de 667 políticos, entre prefeitos, vices e vereadores. O TSE, por sua vez, intensifica o julgamento de casos envolvendo governadores, senadores, deputados e prefeitos. É perceptível o sentimento de que a cultura de leniência - principalmente no aspecto de interpretação das leis - começa a fazer parte da massa falida que se acumula no baú de nossa história.
Publicado em: 07/10/2009
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